O presente trabalho tem como objetivo apontar formas e caminhos interessantes para a introdução do pensamento filosófico em uma prática pedagógica sem no entanto abrir mão da reflexão dessa ação. Entendemos a importância de pensarmos tal tema visto que se apresenta como assunto de pautas mais abrangentes no cenário de reestruturações do ensino, com a inclusão, inclusive do ensino da filosofia no ensino médio. Essa reflexão parte de experiência vivida nas aulas de filosofia da educação da Universidade Federal Fluminense, ministrada peça pela profª Drª Marta D´ângelo para o primeiro período do curso de pedagogia. Ele também é o instrumento de avaliação do próprio autor como aluno do curso em questão.
Pensar o ensino da filosofia é nos debatermos constantemente como as questões estruturais de uma sociedade, pois é por meio da educação e prática reflexiva que se apresentam possibilidades de transformação de realidades ou manutenção de uma situação. Nesta perspectiva nos colocamos a pensar como a filosofia deve ser ministrada sem ser tratada como puro conhecimento a se transmitir. Como o aluno poderá se apropriar desses conhecimentos, ou seja, realmente refletir acerca dos conceitos que influenciam até hoje muitas formas de vida? Sabemos que a filosofia
Não é um conteúdo que se possa aprender definitivamente como um dado científico para posterior utilização tecnicista em determinado setor da vida, mas uma constante tarefa por cumprir. O professor de filosofia como mero apresentador e repassador de conteúdos culturas, científicos ou até filosóficos seria , nessa acepção, ao contrário de Sócrates , o verdadeiro personagem ocupado em corromper a juventude do mundo”.( SCHNEIDER:2002, pág. 67).
Nessa perspectiva, então, observamos que é preciso coragem para ministrar filosofia de forma que o aluno possa refletir a partir do conhecimento que adquire. Como nos diz o prof. Schneider, a filosofia não é composta por um conteúdo que se possa aprender definitivamente e isso já nos indica o cará ter de aprendizado contínuo e interminável que a filosofia nos apresenta . Então devemos saber antes de tudo que para se obter uma aprendizagem significativa é preciso o contato estreito com o texto desenvolvendo uma leitura que, acompanhada de uma contextualização, possibilite ao estudante um caminho para a reflexão no lugar de apenas saber nomes e datas.
Aqui podemos abrir um pequeno parênteses para tecer um comentário a respeito da condição da filosofia no cenário atual, pois durante muitos anos esteve fora do curriculum oficial em função de questões políticas pois
A filosofia se vê rodeada de inimigos, a maioria dos quais não tem consciência dessa condição. (...) Ela é considerada perigosa. Se eu a compreendesse, teria de alterar minha vida. Adquiriria outro estado de espírito, veria as coisas a uma claridade insólita, teria de rever meus juízos. Melhor é não pensar filosoficamente” (JASPERS apud FAVERO, pág.101)
É sabido por todos que o exercício da reflexão põe em jogo poderes instituídos, questiona o já feito e afronta ideias estabelecidas. Não é por acaso que essa matéria foi retirada dos currículos oficiais em um período em que a perseguição política não permitia não permitia espaço para nenhum tipo de projeto, nenhuma opinião contrária ao regime.
Ficamos, por tanto, destituídos de liberdade de pensamento durante muitos anos ´com o prejuízo para uma geração inteira poise somos conscientes de que são cada vez mais frequentes as tentativas de excluir progressivamente a filosofia dos currículos obrigatórios , substituí-la por outras disciplinas supostamente mais úteis ou práticas para o mundo de hoje.
Sabemos que o pensamento se desenvolve lentamente, ele necessita de tempo para amadurecer até que ganhe corpo e então, um tanto quanto invisível , penetre nas relações, nas instituições. Nossa história com o pensamento apresenta algumas interrupções. Nesse trabalho não poderemos aprofundar esse aspecto, mas é importante que se diga que essas interrupções foram fundamentais para criar uma aversão ao exercício da reflexão ativa. Aquela que realmente pensa a realidade como espaço de ação. O que herdamos desses vazios foi a imagem do intelectual de gabinete afastado da realidade, daí o estigma que a filosofia carrega perante os estudantes e mesmo diante da sociedade como uma atividade improdutiva. Somado a este fato não podemos deixar de indicar a relação conflitosa que existe entre pensamento e consumo. Em uma sociedade cada vez mais utilitária , como coadunar o pensamento reflexivo com a necessidade de produção imediata?
Esse nos parece ser o desafio daqueles que são responsáveis pelo trabalho com a filosofia. Nos propomos, aqui, apensar um pouco sobre a pertinência de um ensino significativo. Não pretendemos esgotar o assunto, nos limitamos apenas a apresentar indicações baseadas em experiência vivida em sala de aula. Também para nós tem sido uma descoberta diária a cada nova pergunta a cada novo comentário vindo dos estudantes, pois é da dúvida que se retira o material para o novo passo, um novo-velho texto pois
O lugar para esse exercício é a sala de aula! Lugar privilegiado! Pois aqui é ainda possível a devoção ao estudo, aqui ainda é possível formar uma comunidade, professores e alunos, comprometida com o cultivo do pensamento, sensível aos méritos da conversação e do diálogo” (BUZZI: 1993, pág.10).
A despeito da realidade histórica o ensino da filosofia e sua própria existência nos currículos oficiais, observamos, então a necessidade de pensarmos a melhor forma de apresentar ao estudante, uma introdução ao pensamento filosófico e suas origens. Para tanto é preciso lançarmos mão dos textos que e nos parecem ser material indispensável para esse trabalho. Levando em consideração o pensamento do Educador Paulo Freire que em uma perspectiva muito particular tinha como pressuposto o mundo como texto, sendo esse passível de uma leitura.
Acreditamos que a aproximação do texto sem seu contexto de nada adiantaria ao iniciante em filosofia, pois a contextualização histórica auxilia no entendimento dos motivos pelos quais tal e qual pensador, estabeleceu seu sistema filosófico. Pois, segundo Paulo freire
A insistência na quantidade de leituras sem o devido adentramento no texto a ser compreendido e não mecanicamente memorizado,revela uma visão mágica da palavra escrita , visão urge ser superada (FREIRE: 1989, pág12)
A partir desta citação percebemos como é importante que o estudante de filosofia valorize a qualidade da leitura em detrimento da quantidade, procurando questionar os detalhes daquele texto em seus aspectos históricos e mesmo naqueles que dizem respeito ao significado das palavras. É preciso, então, que nos lancemos na aventura do questionamento alicerçados pelo contexto histórico para que as possibilidades de uma reflexão sejam realmente viáveis. Nesta medida o professor que não se conhecer como pesquisador -filosofo, aquele que pensa o conteúdo, transmitirá simplesmente ao estudante aquilo que já foi pensado. Nos parece ser então um desafio a ministração da disciplina filosofia seja ela em que grau for, ensino médio ou universitário pois
O que cabe ao professor é estimular a levar adiante este desafio. Filosofar, então, é atrever-se a pensar por si mesmo, e fazê-lo requer uma decisão. Há que se atrever a pensar, por que isso supõe uma maneira nova de se relacionar com o mundo e com os conhecimentos, e não meramente reproduzí-los. (CERLETI:2004,´pág. 30).
Nos parece, então, que o exercício de filosofar não se adequa ao institucionalismo, correndo o risco se assim for tratado, de engessar-se transformando-se em discurso. Esse também é um fator que exige sensibilidade do professor, pois, o filosofar também exige do estudante um “deslocar-se” de seu próprio tempo para ser capaz de se aproximar dos primeiros questionamentos. Um descolar-se também da própria realidade estabelecida como a conhecemos. Observamos em muitos casos que esse tem sido o motivo pelo qual muitos estudantes se sentem enfatuados .
Daí a importância de enfatizarmos que o conhecimento histórico se faz imprescindível para o estudante de filosofia pois “os conteúdos não devem ser veículos da repetição mas “pré-textos” para que outro possa construir seus próprios textos” (HERMOSILLO apud CERLETTI pág.34).
Não será possível apenas estabelecer uma metodologia a ser aplicada para o ensino da filosofia. E aqui somos tomados pela dúvida. Existe uma maneira adequada de ensinar filosofia?
O que conseguimos observar no decorrer deste curso é que o professor precisa ele mesmo ser um questionador e partindo destas questões construir sua aula oferecendo ao estudante, também, a possibilidade de participar desta construção pois
Se em sentido estrito consideramos o ensino de filosofia filosófico, o professor deverá ser um filósofo que cria e recria cotidianamente seu mundo de problemas filosóficos e suas tentativas de resposta, e isto, ele não faz sozinho, mas com seus alunos. (CERLETTI;2004, pág.37)
Conclusão
Começamos nosso trabalho procurando pensar a melhor forma de fazer uma introdução ao estudo da filosofia. Lançando mão da experiência vivida em sala de aula no curso de graduação em pedagogia esperávamos indicar o caminho ou um método para essa introdução. No entanto no decorrer de nosso trabalho nos deparamos com alguns pontos que nos parecem significativos para que um aprendizado significativo ocorra. Dentre esses pontos está a disponibilidade do estudante, ou seja, seu comprometimento por outro lado encontramos o descrédito que a filosofia encontra em nossa sociedade pois em
uma civilização marcada pela mentalidade técnico-instrumental dificilmente consegue perceber a importância da filosofia no mundo de hoje. Nossa sociedade e nossa cultura costumam considerar que alguma coisa só tem o direito de existir se tiver alguma finalidade prática, muito visível e de utilidade imediata . (FÁVERO: 2002, pág.100).
Destacamos, pelo menos, três pontos importantes. Em primeiro lugar é preciso que o estudante tenha o desprendimento , deslocando-se dos problemas de seu tempo, para compreender melhor um conceito ou o pensamento desenvolvido por um filosofo. Em segundo lugar constatamos que a leitura deve ser feita em qualidade evitando bibliografias extensas. O aprofundamento em pequenos textos por muitas vezes se faz mais produtivo. Identificarmos em Paulo Freire uma forma de leitura que leve em consideração essa maneira diferenciada de leitura. Por último, mas não menos importante, olhamos para o professor e percebemos que seu comprometimento com a construção incessante dos conteúdos deve ser também condição para que o conhecimento seja desenvolvido. Portanto
É nessa situação e exigência de uma crítica radical que se insere o professor de filosofia, como mediador de um processo de conhecimento, possibilitando a construção da consciência crítica nos educandos. Isso implica uma permanente atividade de estudo.
“Estudar é uma tarefa difícil que requer uma atitude crítica e uma disciplina intelectual sistemáticas adquiridas somente através da prática”(FREIRE apud GIROUX 1997, pág.123 in o ensino de filosofia pág.228).
BUZZI. Arcângelo R. Filosofia para principiantes. Petrópolis:Ed. Vozes, 1993.
CARNEIRO LEÃO. Emmanuel. Aprendendo a pensar. Petrópolis: Ed. Vozes.1977.
DEMO. Pedro. Avaliação qualitativa. Campinas :Autores associados.1995.
--------------- Metodologia para quem quer aprender. São Paulo: Ed. Atlas, 2008.
FÁVERO. Altair Alberto. Um olhar sobre o ensino de filosofia. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 2002.
FREIRE. Paulo. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1994.
------------------Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra,1971.
---------------- A importância do ato de ler. Campinas: autores associados, 1989.
KOHAN. Walter . Filosofia: caminhos para seu ensino. Rio de janeiro: Dp &A, 2004.
MARSHALL, Jonh P. O professor e sua filosofia. São Paulo: Ed. Summus, 1977.
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