Ao
entrarmos em contato com as “investigações filosóficas” nos deparamos com um
Wittgenstein que parece questionar seus próprios caminhos, e ao mesmo tempo, ao
fazer a crítica à linguagem, coloca em questão o uso feito pelos filósofos que
na sua concepção abusam de conceitos na tentativa de organizar a
linguagem. ´
Sua
crítica a uma filosofia da linguagem ideal ficará evidente quando Wittgenstein
(1999) nos fala sobre a ineficiência da lógica diante da linguagem cotidiana (entre
os parágrafos 89 e 102) e que na verdade o papel da filosofia não é, de forma
alguma, responder as questões, mas sim apresentar o que acontece nos processos
de comunicação no caso da filosofia da linguagem. A análise puramente lógica
das proposições, segundo Wittgenstein, não é suficiente para “clarificar” ou
“desenfeitiçar-nos”, pois não apresenta uma visão panorâmica do uso de palavras
e frases. Quando Wittgenstein diz que
não há uma filosofia de segunda ordem para falar da “filosofia” nos parece
certo afirmar que a criação de conceitos estabelece imediatamente uma
restrição, ou seja, criam-se limites de entendimento aos quais só estarão
inseridos aqueles que participam, ou seja, que dominam os significados desses
conceitos. A partir dai se desenvolverá uma crítica à construção de todo
pensamento metafísico, que segundo o filósofo pode ser considerado um castelo
de areia, uma vez que sua construção é arbitraria. “Estamos aprisionados em
nossas próprias regras” diz Wittgenstein continuando seu questionamento ao que
ele considera um abuso. Outra passagem que ilustra bem a questão do
“enfeitiçamento pelas vias de nossa linguagem” é a imagem dos “óculos através
dos quais enxergamos” a realidade. Wittgenstein dirá que nós “nem pensamos em
tirar os óculos”, ou seja, não procuramos olhar por nossos próprios olhos,
estamos a todo tempo orientados por outras lentes. Observamos o mundo por meio
de outros olhos. Uma metáfora que diz muito a respeito de como a construção
linguística norteia nosso pensamento.
Para
ilustrarmos a explicação lançamos mão aqui do exemplo que ocorre no filme 1984,
baseado no livro de George Orwell. Duas situações podem nos aproximar dessa
ideia de enfeitiçamento a que Wittgenstein nos fala. A primeira acontece quando o sistema de
propaganda do Big Brother diariamente apaga as notícias publicando apenas
aquilo que interessa ao governo, criando assim uma ilusão de paz. A segunda
situação aparece na criação da “novilingua” pelos projetistas com o intuito de
eliminar quaisquer possibilidades de insurgimento contra o governo. Essa
criação ilustra muito bem a afirmação de Wittgenstein de que “estamos presos a
nossas próprias regras”. Nessa
perspectiva crítica em que se apresenta o pensamento de Wittgenstein,
poderíamos afirmar que sua investigação quer quebrar aquilo que já foi
cristalizado e é tido como “verdade absoluta”.
Como
seria possível a verdade de uma palavra ou frase se seu uso pode mudar a cada
contexto? Observamos, seguindo o pensamento de Wittgenstein, que a palavra, o
signo não guardam em si um valor de verdade, mas o faz surgir na medida em que
está inserido em um “jogo de linguagem”. E mesmo assim, dentro deste jogo de
linguagem podem existir nuances.
A ideia de produzir uma linguagem ideal que
nos dê acesso a uma essência primordial é eliminada por Wittgenstein que diz
que não há nada oculto a ser descoberto, tudo está a nossa amostra, mas como
está tão evidente não conseguimos perceber. A linguagem ordinária não necessita
de consertos, ela possui tudo o que é necessário para nos relacionarmos com o
mundo e entendê-lo nos dirá Wittgenstein. Por isso é necessário que o filósofo
traga o conceito ao seu uso ordinário promovendo, assim um
“desenfeitiçamento”.
WITTGEISNTEIN. Ludwig. Investigações filosóficas. São Paulo. Ed. Abril 1999.
RAMOS, Celso. Análise da imagem como linguagem. Uma introdução à filosofia por meio da estética. Dissertação de mestrado em Filosofia (pag. 29 a 31), CEFET/RJ,2016.